segunda-feira, 22 de outubro de 2018

Encarceramento


Hoje amanheceu e os meus sonhos se confundiam
Com a chuva que insistia em bater na minha janela
E era tudo ventania em meus ouvidos
Daqueles que um dia estavam ao meu lado
E já não sei mais para aonde eles caminham.

Nos meus sonhos as minhas mãos bloqueiam portas quebradas
Impedindo a entrada dos que querem me machucar,
Pessoas de bem que estão acima de todos
E querem escancarar as portas da minha liberdade ferida
Para marcarem na minha pele o vermelho do meu sangue descartável.

E então eles me cercam e me prendem os braços,
Já não podendo me mover, me arrancam os lábios,
Já não podendo mais falar, me mutilam as pálpebras,
Já não podendo mais fechar os olhos só me resta esperar
Que o tempo seja rápido e daqui me arranque para outro lugar.

Os mortos-vivos mal esperam poder comer a minha mente
Os meus pensamentos os ferem e a eles só resta me zumbificar
Que eu fique calada, acuada, parada, seguindo a mecânica do relógio
Enquanto vejo o tempo ao meu redor mudar e eu já estar resumida a nada,
Sonhando com o dia que ainda podia acordar e não me sentir encarcerada.

Priscila de Athaides – 22/10/2018

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Pátria


Precisamos nos olhar no espelho
E perceber quem somos
Tudo o que nos cerca faz parte de nós
O povo, a cor, a terra, o gênero, os amores.
E quem somos?
Aquele que falará por nós
Precisa ter a nossa voz
Ou o que somos será comprimido, quebrado, estraçalhado
A ponto de não termos mais identidade
Ou corpos, ou vozes, ou mentes.
Os muros que nos separam são frágeis
E pouco a pouco serão derrubados
E quando esse dia chegar
Muitos de nós teremos as mãos manchadas de sangue
E não haverá água que as purifiquem
Apenas o peso das armas
O fogo que nos extinguirá
Nos reduzindo a uma lembrança distorcida
De tempos de paz.
O que fazer quando não houver saída?
Quando apunhalarmos todos que falavam por nós?
O que faremos?
Para onde iremos quando as fronteiras forem bloqueadas?
Ou como retornar quando não houver mais pátria?
O que estamos fazendo?

Priscila de Athaides – 05/102018