Parte V
Escutei de um sábio andarilho que pessoas certas não fogem, elas ficam.
Me peguei questionando sobre a predestinação das coisas e pessoas. Será que
apenas existe o acaso das coisas? Meras coincidências? Será que existe algo pré
planejado em algum plano astral? Ou precisamos apenas seguir com as nossas
vidas e esperar a morte bater em nossas portas para adentrarmos em um eterno
vazio, inconscientes de tudo o que acumulamos em vida? A vida importa? Devemos
nos segurar no extraordinário agora acumulados de experiências passadas apenas
seguindo para o inevitável?
Talvez isso tudo possa soar como contradições. Mas o que seria da vida
sem questionamentos? O que nos moveria senão a fagulha do entendimento de como
esse vasto universo que nos expande funciona? Ser ou não ser?
Me sinto metamórfica em minha jornada, tentando me conectar com a Sibila
interna, buscando entender sobre o que se foi, o que será e o que poderia ter
sido. E se? Mas as coisas agora apenas estão (passageiras como sempre) e o que
se passou toma um pedaço de mim, injustamente. Todos os ciclos finalizados em
que me penduro, esses anéis conectados se emaranhando em meus pensamentos, me
tornam imensa por dentro, mas desconectadamente me direcionam para vários
cenários do que poderia ser e não foi. São as peças de um grande quebra cabeça
que se encaixam pacientemente, mas algumas delas se perderam nesse tempo-espaço
que se expande em minha existência fugaz. Quem sou eu no meio de tantas
vivências que me perpassam?
Me sinto às vezes vilanesca em minha própria vida, auto sabotadora, auto
centrada talvez. Mas eu apenas sigo a vida em seu percurso tortuoso, tentando
me encaixar nesse mundo estranho. E o tempo me carrega em ondas cíclicas que me
afogam e me devolvem para a superfície, me sufocando e se adentrando em meus
pulmões, pesando. Que as águas salgadas levem de mim esse pesar e me faça
flutuar em águas calmas.
Cronos continua batucando como as batidas de um coração, bombardeando
vida, mas contando em cada batida a aproximação da morte. Cada dia me aproximo
mais desse fatídico destino, a única certeza que tenho. Descerei como Perséfone
ou subirei como a amada dantesca Beatrice? Ou apenas deixarei de ser, como
supernovas, tornando-me apenas um buraco negro na história desse planeta
corruptível, tornando-me um túmulo desgastado enquanto os meus restos se
transformarão em pó, desaparecendo no vento sussurrante? Será que o vento
sussurrará o meu nome em seus redemoinhos, adentrando os sonhos dos andarilhos
de minha vida?
Me sinto só em meio a tantos bilhões nessa Terra estranha. Nada me
compele, ninguém me atrai nesse momento lutuoso. Sigo fantasiando sobre o que
se foi, pois a minha mente floreia o que tivemos, como chananas em meu caminho.
Mas as chananas são sazonais, o caminho logo será coberto de mato e lixo e
talvez não encontre mais beleza ao meu redor. Mas sei que o canto dos pássaros
sempre me despertará para mais uma breve jornada diurna, me lembrando de meus
afazeres. A vida não para, independentemente de como eu esteja. Não, não existem
tréguas, a vida segue cheia de repetições até que tudo se acabe e percebemos a
brevidade de estar aqui, despertando e dormindo enquanto a vida passa nos
deixando reflexões sobre o que ficou para trás. E que destino triste deixar em
nossos caminhos pessoas que nos adicionam tanto em troca de momentos fugazes.
Mas somos responsáveis pelas nossas escolhas, sendo destinado ou não. Existem
caminhos escolhidos e devemos encarar as consequências, sendo a colheita boa ou
ruim. Estamos sempre semeando em nossas caminhadas e em algum momento a foice
colherá de nós os frutos.
E eu quero apenas seguir adiante, subir esse abismo para a ponta do
penhasco e apenas observar o horizonte. Essa escalada me pesa tanto que às
vezes desejo apenas cair e me afundar nesse mar de lágrimas sabendo de tudo o
que poderia ser e não é, impedida de ver o que será agora que o pêndulo aponta
para outros caminhos. Eu me vejo tão abundante em minha jornada, ramificando-me
em tantos, tão elogiada, vejo-me indo além do meu quarto e sala para a porta
afora, iluminando mentes que em mim buscam sabedoria. E me pego ainda assim
deixando palavras cortantes me conduzirem, ignorando fatos. É você, é sempre
você quem me coloca as vendas e crava o meu coração de espadas, tão tolo em si
mesmo em busca de uma calmaria inexistente nas mentes tumultuosas de um mundo
adoecido e agitado. Você, estagnado em seu caminho tortuoso em busca de algo
que não vem, você também precisa deixar tantas coisas para trás e se envolver
em um abraço que te acolha e te entenda antes da sua colheita. Quais frutos
você tem plantado? Talvez não tenhamos salvação e estejamos nos destinando a
uma vida vazia. Ou talvez eu não, eu tenho tanto amor para dar e tantas portas
para abrir ainda, eu sou um marco para tantos, a suma sacerdote empunhando o
dourado ensinamento, confortando, alcançando potenciais e expandindo-os,
colidindo com universos outrens, adicionando novos caminhos para além do
arco-íris em quem vem até mim, e isso é tirar as vendas e entender o que se
mostra diante de mim, dos meus pupilos que me abarcam em suas doces palavras de
admiração. Ao menos uma parte de mim faz parte dessa bela jornada que eles
seguem. Afinal, eu sou tantas multiplicando-me internamente. Sou legião. Sou
multifacetada. Sou um universo inteiro repleta de camadas. Eu sou e estou,
passageira nessa confusa vida. Te convidando a me acompanhar nessa insana
jornada.
E quem é você? Obumbrata et velata.
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