quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Último Suspiro

Estou presa a minha alma atormentada, essa alma eterna, essa alma velha, nesse corpo morto. Tenho que me encarar todas as madrugadas, solitária, cansada, faminta. É satisfatório me alimentar do seu sangue, estranho. Eu também costumava ser assim, amedrontada. Mas veja bem, a morte é a maior liberdade que podemos alcançar. Esqueça essa baboseira de juventude eterna! Vê os meus olhos? Estão velhos, estão mortos. Cansei.

Foi fácil te caçar, presa. Vocês humanos são tão cheios de luxúria, tão cheios de curiosidade. Nós estamos sempre famintos. Apenas um suspiro, um pouco de carne a mostra, um jeito sedutor de olhar, de dançar. Pronto. Você é meu. Mas não se engane, não passa de combustível, e vai permanecer dentro de mim até a próxima fome. Tão frágil essa vida humana. Efêmera.


E eu adoro a cor do seu sangue, esse vermelho, esse vermelho quente, esse vermelho quente e saboroso. Adoro lambe-lo do seu pescoço, te ouvir sussurrar de medo, te ouvir dar o último suspiro, e ainda assim, enquanto morre, te ver entrar em êxtase, ver você gozar. Acho tão patético, eu rio da sua cara. Como é fácil dar prazer a vocês, até mesmo no momento mais aterrorizador. Mas é isso, querido. Eu te faço gozar, você me alimenta. Boa troca não?


Não vou negar, adoro lamber esse gozo das suas cochas, logo após acabar com a sua vida. Ele permanece quente, dá ao sangue um gosto especial. É talvez o mais próximo que eu me aproximo da vida. A sua semente, a sua herança em meus lábios, perdida. É saborosamente irônico. Por isso prefiro vocês às mulheres, com as suas lubrificações, as suas vaginas frenéticas. Mas a forma como elas gozam! Como adoro ver as mulheres se contorcendo enquanto morrem. Por isso vou direto ao ponto, mordo o clitóris. E elas gritam de dor, de prazer. Adoro! Mas nada se compara a vocês, cavalheiros. Exceto quando a mulher está amamentando. Isso desperta em mim o lado mais humano. O leite maternal. Isso me faz chorar todas as vezes. É nesse momento que eu gozo. Saber que estou tirando pra sempre a mãe dos infelizes, o colo, a comida, o conforto. Eu juro, isso é tão bom! As vezes eu me alimento das crianças, é interessante. Sangue virgem. Mas é das suas mães que o verdadeiro prazer vem. Do seu leite. É esplendido.


Não sei te dizer se o que eu faço com você é uma maldição ou uma benção. Você verá o mundo pela última vez, e ele será os meus olhos, redondos, vazios, azulados, assim como o seu planeta. Aterrorizador não? Não adianta se desesperar, não adianta me bater, a sua força é nada diante da minha. Eu estou aqui há muito tempo e não há nada que você possa fazer para adiar o seu fim. É aqui, é agora e é comigo. Au revoir.


Priscila de Athaides – 14/10/2009

Um comentário:

Fau Ferreira disse...

Então, Pri, gostei do conto sim, apesar de não encará-lo como vampiresco, pareceu-me que você estava fazendo uma metáfora, talvez inconsciente. Só o quarto parágrafo é que achei que ficou meio perdido, fugiu um pouco da linha que você vinha seguindo. Mas, no último você retoma a linha da narrativa. Ficou legal!!! Parabens... E continue sempre, não desista. Você tem talento.

Um abraço,